ENTRE A LEI, A MORAL E A DESOBEDIÊNCIA CIVIL: O CASO DO FECHAMENTO DOS COMÉRCIOS DURANTE A CRISE DO CORONA VIRUS EM MARIANA

    Por Júlio César Vasconcelos, Mestre em Ciências da Educação, Professor, Coach e Consultor Organizacional. Sócio-Proprietário da Cesarius Gestão de Pessoas.

    “As atitudes são mais importantes do que os fatos. Qualquer fato que enfrentamos, por mais penoso que seja, mesmo que pareça irremediável, não será tão importante como nossas atitudes para com este fato. A maneira como você reage, faz a diferença” … (Autor desconhecido)

    Estamos vivendo momentos extremamente conturbados nos últimos dias com o episódio envolvendo o Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG que determinou o fechamento do comércio local, tendo em vista a não adesão do Município de Mariana ao Programa Minas Consciente do Estado de Minas Gerais. Liderados pela Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Mariana – ACIAM, os comerciantes se reuniram e saíram às ruas em manifestação pública protestando contra decisão do Tribunal e reivindicando a permanência do funcionamento em consonância com o Plano de Combate ao Vírus implantado com sucesso pelo Município. Diante do contexto, vale aqui uma breve reflexão sobre algumas particularidades existentes entre a lei e a moral relacionados ao caso.    

    O termo Moral vem do latim “moralis” e significa maneira, caráter, comportamento próprio e está relacionado com as intenções, decisões e ações vistas como próprias ou impróprias no meio de uma determinada comunidade. Sendo assim, roubar ou matar, por exemplo, além de logicamente serem atitudes consideradas como crime, portanto ilegais, são também consideradas, de uma forma geral, como impróprias em sociedade, ou, mais adequadamente, chamadas de imorais. No entanto, as coisas nem sempre funcionam assim de maneira tão clara; existem algumas atitudes que, embora sejam consideradas ilegais, nem sempre podem ser consideradas imorais. Algumas vezes, a lei que regulamenta alguns determinados procedimentos podem ser imorais. Com base neste princípio, o grande Jurista Jeremy Bentham, (Inglaterra, 1748-1832) criou a Teoria dos Círculos Concêntricos que estabelece que o campo de aplicação da moral é maior do que o campo do Direito e que este se deve se subordinar à moral.

    Diante de tal abordagem, surgem algumas perguntas que não querem se calar:

    -É legal a determinação do TJMG de suspender o funcionamento dos comércios de Mariana, mas seria essa determinação moral tendo em vista o desespero que estão passando os comerciantes sem poder gerar renda desde março para honrar seus compromissos financeiros e sem previsão de liberação?

    -É um fato que se os comerciantes não cumprirem a determinação do TJMG estarão cometendo um ato ilegal, mas seria esta atitude imoral tendo em vista o mesmo argumento citado acima, além de que vários outros estabelecimentos, inclusive os bancários, supermercados, mineradoras e prestadoras de serviços, entre outros continuarem funcionando de forma perigosamente propícia à contaminação pelo vírus?

    O poetanaturalistapesquisadorhistoriadorfilósofo Henry David Thoreau (USA 1817-1861) criou o conceito de desobediência civil, uma forma de protesto político feito pacificamente, que se opõe a alguma ordem que possui um comportamento de injustiça ou contra um governo visto como opressor pelos desobedientes. Na eventualidade de um governo vigente não satisfazer as exigências de sua população, esta tem o direito de desobedecê-lo. Este conceito foi aplicado com sucesso por Mahatma Gandhi no processo de independência da Índia e do Paquistão e por Martin Luther King na luta pelos direitos civis e o fim da segregação racial nos Estados Unidos. Surge então mais uma pergunta que não quer se calar:

    -Seria essa a solução mais adequada para os comerciantes de Mariana em situação de desespero, sem encontrar um caminho para resolver seus gravíssimos problemas de ordem econômico- financeira, com impactos na vida pessoal e familiar? 

    É um fato que os riscos de uma abertura geral desorganizada e sem critérios dos estabelecimentos comerciais irá agravar a contaminação pelo vírus, aumentando de forma exponencial o número de vítimas fatais, mas também é um fato que as medidas tomadas pelo governo para amenizar a crise financeira estão sendo insuficientes e que se nada for feito de forma eficaz os comerciantes vão falir e a economia irá se transformar em frangalhos, elevando também o número de vítimas fatais causadas pela miséria, pela fome e pelo desespero.

    Então, qual a solução? Infelizmente, entendo que ninguém tem uma resposta mágica, pronta para ser colocada em prática, o que seria o ideal, mas tenho certeza absoluta que o caminho passa por um espírito de união e diálogo assertivo em busca de uma solução equilibrada, afastando de forma determinante as atitudes extremadas, monocráticas e a disputa obsessiva e egocêntrica pelo poder entre os principais protagonistas de plantão.

    Volto aqui a trazer para reflexão meu antigo e precioso mantra: “As atitudes são mais importantes do que os fatos. Qualquer fato que enfrentamos, por mais penoso que seja, mesmo que pareça irremediável, não será tão importante como nossas atitudes para com este fato. A maneira como você reage, faz a diferença” …

    Quem tem ouvidos que ouça!

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