Minha mestra, meu amor

    Por Roberto dos Santos

    Hermes voltou a estudar depois de muito tempo de inatividade.

    A vida lhe impusera alguns contratempos e a luta para vencê-los retardaram seus passos, mas o rapaz ávido por conhecimento recolocou-se no caminho e seguiu adiante.

    Gostava de português e vez por outra estava escrevendo pequenos textos tentando com as palavras descrever os fatos da vida.

    Sua maior produção textual foi uma redação que fez atendendo a uma solicitação de sua mestra.

    O texto que escreveu chamou de “Uma obra de arte”.

    O jeito que descreveu os fatos chamou a atenção de outras pessoas além da sua professora.

    Era uma escrita rebuscada e cheia de emoção, dando a entender que a obra de arte que ele admirava e posteriormente traduziu em palavras fosse algo sublime. Parecia ser um quadro ou escultura.

    Num determinado momento as palavras começaram a mexer mais avidamente com a imaginação. Parecia ter vida.

    Começou a falar de alguma coisa tão interessante que dava vontade de ver o objeto descrito. Disse:

    — Um vestido azul com detalhes brancos, sapatos pretos envolviam seus delicados pés. A cabeça tinha uma sutil inclinação para a direita. O braço direito descansava sobre a perna do mesmo lado. A perna esquerda estava levemente flexionada, e o olhar além da notória beleza, tinha simplicidade e altivez, o sorriso ia de encontro ao meu e me incendiava.

    Depois de minuciosa contemplação, de descansar meus olhos sobre aquela imagem, como que um belíssimo quadro na parede, tive a certeza de que não tinha nada a dever as grandes obras de arte eternizadas pelo tempo.

    As mãos que moldaram essa maravilha eram divinas, não tenho dúvida. Simples, porém, o que há de mais belo.

    Hermes conseguiu prender a atenção de sua mestra. Ela já estava quase perguntando que obra de arte era aquela que com tanta emoção descreveu.

    Mas Elisabeth sua mestra, já na releitura da produção textual, notou informações subjetivas percebendo um jogo interessante de palavras.

    Elizabeth sentada em sua cadeira, de costa para o quadro negro, olhou para Hermes lá na fileira do canto cabisbaixo evitando qualquer contato visual com ela. Parecia uma atitude defensiva.

    O motivo da repentina atitude da professora era as coincidências que percebera no texto, após lê-lo três vezes.

    Muito daquilo que explicava a obra de arte, constituía a indumentária de Elizabeth. Apenas os adjetivos que qualificavam a obra, eram frutos da sensibilidade de Hermes.

    Tudo levava a crer que aquele moço que cursava o último ano do ensino médio, que acertava o passo na estrada da vida, sem pensar no tempo que passou, havia se apaixonado.

    A obra de arte citada em seu texto era Elizabeth, e ela já havia percebido isso, porém a certeza inexistia.

    Ela ficou confusa sem saber o que pensar afinal as palavras de Hermes eram emocionadas e belas.

    Ele era mais velho que ela – não muito – estava na escola buscando alcançar as metas adiadas pelo tempo e circunstâncias. Era aplicado, trabalhava e estudava cumprindo suas obrigações a contento.

    Ela ficou feliz mesmo sem ter a certeza.

    No final da aula, já do lado de fora da escola, Elizabeth o chamou e indagou quanto as suas suspeitas. Ele ficou meio trêmulo e com a face ruborizada, mas mesmo assim confirmou as suspeitas dela.

    Porém disse muito mais do ela queria saber:

    — Há dois anos você é o motivo de eu estar aqui. Em alguns momentos quase desisti, mas a vontade de te ver, sempre me trazia para cá. Os dias foram passando, e você foi ficando cada vez mais em mim, como uma imagem impressa em papel fotográfico, sendo eu o dito papel. Você era meu ânimo, meu impulso, minha vontade.

    Você era o sonho que eu realizava todos os dias.

    Elizabeth ficou muda ao ouvir tudo isso. O que dizer agora? Era o que perguntava no seu íntimo. Aquelas palavras mexeram com a professora. E abandonando o silêncio que a envolvia disse a Hermes:

    — Embora tenhamos quase a mesma idade, eu sou sua professora. Como espera que eu trate desse assunto?

    E ele respondeu:

    — Não te peço nada, apenas que me deixe te amar e se for para sempre, que eu morra de amor.

    E naquele dia Elizabeth chorou ao ouvir as belíssimas palavras de amor proferidas por Hermes. O coração da professora se rendeu ao amor do moço e passou a bater no mesmo compasso que o dele.

    Ela embora contida dava mostra de que estava apaixonada, dentro dela uma força estranha fazia com que desejasse estar com Hermes, mas tentava de toda forma não deixar transparecer.

    Elizabeth, não resistiu aos apelos do seu coração e depois de ver Hermes numa sorveteria perto da escola ao final da aula, aproveitou a oportunidade e foi até ele. Abriu seu coração e as palavras que disse alcançaram o coração dele com furor. Combinaram de viver esse amor com todas as forças, estabelecendo para dentro dos portões da escola a manutenção da relação professor x aluno. Ninguém imaginava dentro da escola que entre eles existia um amor intenso, eles se esforçavam em manter incógnito, o amor que viviam no cotidiano fora da escola.

    E os dias que seguiram foram enigmáticos, alguns tentavam descobrir onde estava à obra de arte que encantara tanto a Hermes, e sem saber conjecturavam as mais variadas possibilidades.