Demora no diagnóstico do câncer leva à alta mortalidade de crianças no Brasil
    Comissão Extraordinária de Prevenção e Enfrentamento ao Câncer debate a implantação da 1ª Política de Atenção à Oncologia Pediátrica. Foto: Daniel Protzner

    Comissão ouviu gestores de hospitais que tratam da doença e especialistas sobre o tema, em busca de soluções. 

    A dificuldade de obter o diagnóstico precoce do câncer infantojuvenil, devido à insuficiência de centros especializados em oncologia pediátrica, torna o Brasil um país com mortalidade alta por essa doença. Esta foi a principal conclusão dos participantes de audiência pública que a Comissão Extraordinária de Prevenção e Enfrentamento ao Câncer realizou nesta quinta-feira (14/9/23), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). A reunião foi solicitada pelo presidente do colegiado, deputado Elismar Prado (Pros).

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    Algemir Brunetto, superintendente e fundador do Instituto do Câncer Infantil de Porto Alegre (RS), resumiu o quadro atual da oncologia pediátrica no País, durante a reunião, que discutiu a implantação da primeira política de atenção voltada a esse setor.

    Ele lembrou que o câncer infantil é o que mais leva a óbitos, apesar de haver grande chance de cura, desde que seja diagnosticado precocemente.

    Brunetto defendeu que uma política para o câncer infantil deve ser diferenciada de uma voltada para o câncer em adultos. Nesse último caso, afirma, são necessários grandes centros para o tratamento; já na oncologia pediátrica, precisa-se de unidade minimamente estruturada para fazer o diagnóstico precoce. Quando isso não ocorre, atrasa-se o diagnóstico e a doença evolui rapidamente.

    Brunetto comemorou a sanção em 2022 da Lei Federal 14.308, que institui a Política Nacional de Atenção à Oncologia Pediátrica, para garantir atendimento integral a crianças e adolescentes (0 a 19 anos) com câncer. Como fruto dessa norma, foi aprovada em agosto de 2023 uma portaria, que traz o plano de atenção ao diagnóstico do câncer infantil.

    Como sugestão, ele propôs a criação de uma auditoria de performance, que avaliaria não apenas o número de atendimentos, mas o índice de cura de cada unidade que trata o câncer.

    Subfinanciamento
    A diretora-presidente do Hospital da Baleia, Tereza Paes, apresentou como um dos principais gargalos o subfinanciamento da saúde como um todo no Brasil, o que dificulta muito a ampliação e as melhorias em áreas específicas, como a do câncer infantil.

    Dentro dos incrementos que ela julga importantes, ela citou investimentos em telemedicina, como forma de ampliar o atendimento oncopediátrico, especialmente no interior do Estado. Também defendeu o estímulo à residência médica na oncopediatria e a formação de mais profissionais qualificados nessa área.

    Por fim, ela lembrou que o Hospital da Baleia vai fazer 80 anos, atendendo a 88% dos municípios mineiros, com 26 leitos para crianças com câncer. Seis oncopediatras atuam na instituição, que realizou 32 mil rádio e quimioterapias no ano passado.

    Endividamento
    Já Cláudio Dornas, diretor de Assistência à Saúde da Santa Casa de Belo Horizonte, reclamou do endividamento do estabelecimento, devido, entre outras causas, ao custo mensal a descoberto na oncologia infantil. Segundo ele, só nesse segmento, a Santa Casa gasta R$ 300 mil por ano além do que o SUS oferece de reembolso. Na área oncológica como um todo, esse prejuízo é de R$ 1 milhão. “Não temos condições de bancar isso anualmente”, reclamou.

    Com todas as dificuldades, a Santa Casa é o maior hospital que atende pelo SUS no Estado, em volume de atendimentos na oncologia. Ele informou que a unidade trata de todos os níveis da doença, tendo recebido prêmio nos Estados Unidos. Ainda assim, ele reconhece que o índice brasileiro de mortalidade na oncologia infantil é bem maior que o de países em situação semelhante. Por isso, pediu apoio dos parlamentares e de terceiros para melhorar o atendimento ao câncer infantil. E sugeriu a criação de um protocolo para priorizar o atendimento desse público nos hospitais.

    Anunciou que, a partir de outubro, a Santa Casa iniciará o projeto Carreta da Família, que é um veículo com mamógrafo, consultórios e outros equipamentos para fazer exames preventivos do câncer. Ele citou ainda que o hospital é um dos poucos no Estado que atende pacientes com câncer ocular, o retinoblastoma.

    Audir Ribeiro, médico oncopediátrico do Hospital do Câncer de Passos, afirmou que luta diariamente para conseguir fazer com que os pacientes cheguem no prazo adequado até a unidade. Por isso, o hospital tenta agilizar a aceitação do paciente, mesmo que esteja a longa distância.

    Atendimento oncológico em Minas deve ser desconcentrado
    Amanda Guias, superintendente de Redes de Atenção à Saúde da Secretaria de Estado de Saúde, disse que há grande concentração de unidades de tratamento ao câncer em Minas nas Regiões Central, Sul e Mata. Nas 13 macrorregiões de saúde, há um total de 39 Unidades de Assistência de Alta Complexidade (Unacon) e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon).

    Esses dois modelos têm condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos para assistência de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento do câncer. A diferença é que a Unacon trata apenas dos tipos de câncer mais prevalentes e, necessariamente, não precisa contar com assistência radioterápica. Já o Cacon trata de todos os tipos de câncer e obrigatoriamente deve contar com assistência radioterápica em sua estrutura física.

    Ainda conforme a gestora, a Santa Casa de Belo Horizonte concentra mais de 25% do atendimento de câncer no Estado. Ela informou que das 13 macrorregiões, apenas sete possuem atendimento oncopediátrico.

    Ela considerou como um avanço importante a repactuação do novo aporte de recursos na saúde, com o pagamento de bônus para unidades que entregam mais atendimentos à população. “Tivemos aumento de R$ 154 milhões de recursos. Para a Santa Casa e o Hospital da Baleia, quase quadruplicamos os repasses. Para o Hospital de Passos, foram cinco vezes mais”, registrou.

    Humanização do atendimento
    Maryane Ferreira, representante Regional da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), destacou que a missão da entidade é oferecer meios para que pacientes com essas doenças tenham o tratamento mais adequado possível. Nessa lógica, a Abrale busca priorizar o acesso deles ao diagnostico.

    A entidade oferece ainda apoio jurídico e atendimento psicológico, buscando humanizar o atendimento pediátrico. Ela participa também do calendário anual de campanhas com essa temática e utiliza seus meios de divulgação para isso: revista, canal no Youtube, TV Abrale, Observatorio de Oncologia (que coleta dados sobre a doença) e uma plataforma de oncoensino (com cursos para médicos e estudantes de medicina).

    Plano estadual
    Ao final da reunião, o deputado Elismar Prado disse esperar que o Estado, a partir da apresentação desse diagnóstico, possa apresentar um plano estadual de atenção à oncologia pediátrica. “Temos muito a avançar, mas podemos começar seguindo o exemplo do que já temos de referência em Minas Gerais”, declarou o parlamentar.

    Ele informou que nos Estados Unidos as inovações no atendimento ao câncer infantil propiciaram redução de 50% nas mortes desse público. “No Brasil, cerca de 20% das crianças que morrem com câncer sequer são diagnosticadas”, lamentou. Ele frisou que o País apresenta grandes vazios de atendimento, nas regiões ao Norte. “Crianças não podem ser condenadas à morte porque na sua região não há atendimento”, afirmou.

    O deputado Antonio Carlos Arantes (PL) parabenizou Elismar Prado e seu irmão, o deputado federal Weliton Prado (Solidariedade-MG) pela sua atuação em favor dos pacientes com câncer. “Sabemos que a saúde é subfinanciada, mas quando existe um governo sério e pessoas sérias como vocês, a solução aparece”, disse. Fonte: ALMG.