O que plantas, como bromélias, gramíneas e rosetas, encontradas no alto de grandes montanhas podem revelar sobre a evolução das espécies vegetais e o processo de mudanças climáticas?
Movidos por esta pergunta, pesquisadores dos programas de pós-graduação em Botânica (PPGBot) e em Ecologia (PPGEco) da UFV investigaram a flora de montanhas tropicais da América do Sul, África e Havaí, incluindo vegetações alpinas e florestais.
Eles concluíram que as grandes altitudes têm muito a informar sobre o passado, o presente e o futuro das montanhas, de suas espécies e dos serviços ecossistêmicos prestados aos seres humanos. Os resultados do trabalho foram publicados no periódico Journal of Mountain Science.
Segundo o orientador da pesquisa, João Augusto Meira Neto, as montanhas tropicais apresentam estabilidade climática ao longo dos anos, permitindo estudos precisos sobre mudanças no clima. A proximidade com a Linha do Equador também facilita compreender, com mais precisão, os processos que produzem os padrões de diversidade. As montanhas têm maior variedade de plantas e, no entanto, são menos estudadas. O clima estável delas, de acordo com o professor, as tornam sensíveis às alterações, uma vez que a flora pode ser mais afetada pelo aquecimento global.
“O trabalho restabelece a altitude como importante variável ambiental ao discutir mudanças climáticas nessas montanhas, que poderão confinar espécies raras e endêmicas cada vez mais em direção aos picos, aumentando o risco de extinção e de perda de serviços ecossistêmicos prestados à população humana”.
João Meira explica que o estudo de processos que moldam a vegetação das montanhas tropicais também pode ajudar a propor ações de conservação e de recuperação desses ecossistemas. “Ainda há lacunas na compreensão dos efeitos da altitude sobre a diversidade em montanhas e o entendimento das forças ambientais é passo essencial para a conservação dos ecossistemas”, completa.
Diversidade botânica
De acordo com os autores, a pesquisa também inova ao considerar a altitude como variável ambiental agregadora em montanhas tropicais. Até então, os fatores mais utilizados eram solos e temperatura. “Nossos resultados demonstraram que se trata de uma variável agregadora poderosa, facilitando o estudo de influências de variações ambientais”, afirma Alex Pires Coelho, pós-doutorando no Laboratório de Ecologia e Evolução de Plantas da UFV.
A pesquisa revelou que o aumento da altitude reduz o número de espécies de plantas, com predominância daquelas mais aparentadas entre si – tal parentesco aumenta com a altitude. Isso reforça a noção de que espécies novas, recentemente derivadas, podem ser originadas em maior proporção nas maiores altitudes. “Esse é o efeito de um ambiente altamente seletivo, o qual apenas alguns grupos de plantas são capazes de suportar”, comenta Alex.
O trabalho sugere ainda que novas espécies são produzidas nesses ambientes de altitude extremas, gerando uma flora altamente especializada. “Achamos que, com o aquecimento global, as áreas de temperaturas mais baixas tendem a se deslocar para altitudes maiores nas montanhas, confinando a flora especializada a áreas cada vez menores em direção aos cumes e aumentando o risco de extinção dessas espécies”, diz Carlos Galván-Cisneros, primeiro autor da publicação.
Para o professor João Meira, o aumento da altitude funciona como um filtro ambiental, promovendo diminuição da riqueza de espécies e aumento do parentesco filogenético entre as plantas dessas montanhas tropicais.
Serviços ecossistêmicos da flora de montanhas
De acordo com os pesquisadores, a vegetação de montanhas proporciona importantes serviços ecossistêmicos, como o suprimento de água e estoque de carbono. Pedro Villa, também autor do trabalho, cita como exemplo os Andes tropicais, onde as altas montanhas funcionam como uma grande esponja, que absorve e armazena a água que cai em forma de chuva, neblina ou neve. Gradualmente, ela vai sendo liberada através de rios que abastecem as populações humanas, permitindo que as comunidades biológicas continuem funcionando. Grandes cidades, como Bogotá (Colômbia), Quito (Equador) e Mérida (Venezuela), por exemplo, dependem da água dos montes Páramos.
Metodologia
A pesquisa foi realizada a partir de modelos estatísticos obtidos com metadados de espécies e altitudes publicados na literatura. A partir daí, os autores formularam as árvores de parentesco e os modelos de variação do número de espécies nas três montanhas em cada altitude. O trabalho contou com apoio da Capes, CNPq e Fapemig.
Fonte: Divulgação Institucional UFV