ICHS publica nota de repúdio à demissão de funcionária terceirizada com 17 anos de serviços prestados

    Por Beatriz Granha

    O Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS) da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) publicou uma nota de repúdio por meio do seu Conselho de Unidade, manifestando sua indignação com a demissão da funcionária terceirizada Neudis Epifânio Lisboa Moreira.

    De acordo com a nota, a colaboradora tem sido uma trabalhadora zelosa e exemplar por quase 17 anos, contribuindo positivamente para o desenvolvimento do espaço. O Conselho alega que a funcionária foi demitida de forma inesperada e sob justificativa infundada, e defende que esse fato “reflete uma preocupante tendência de descartabilidade do ser humano e precarização do trabalho”. 

    Na nota de repúdio, o Conselho do ICHS destaca ainda que a valorização dos profissionais que atuam no Instituto é fundamental para a construção de um ambiente de trabalho amigável e respeitoso.

    A precarização do trabalho, fenômeno crescente no Brasil, compreende ações que ferem a dignidade e os direitos do trabalhador, como longas jornadas, remuneração indevida, condições inseguras de trabalho e instabilidade. A partir de mudanças na estrutura do sistema capitalista, surgem novas formas de trabalho que valorizam cada vez menos o empregado: de acordo com um relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), publicado em 2023, “a atual desaceleração econômica mundial vai forçar cada vez mais trabalhadores e trabalhadoras a aceitar empregos precários, de baixa remuneração e sem proteção social, reforçando ainda mais as desigualdades expostas pela pandemia.”

    Num cenário de retração econômica, agravado pelo período pós-pandemia, grande parte dos brasileiros se submete a trabalhos informais, ou muitas vezes em situações precárias, por necessidade. Nos últimos anos, a terceirização tem sido a escolha de muitas empresas, especialmente pela redução de custos e de responsabilidades com pessoal. Muito se fala sobre os riscos e consequências dessa tendência, como a possibilidade de redução na remuneração, nos benefícios e nas garantias trabalhistas, configurando o processo de precarização. A adoção dos serviços terceirizados deixa os funcionários com menor estabilidade e segurança, e, além disso, pode exercer forte impacto na cultura organizacional, que não mantém mais o mesmo padrão da empresa.

    Em nota já publicada em outra ocasião pelo Sindicato dos Trabalhadores Técnicos Administrativos da UFOP (ASSUFOP), o sindicato afirma que uma de suas bandeiras sempre foi “resistir à terceirização não apenas no âmbito universitário, mas também em todo universo laboral brasileiro.” Por meio da nota, a ASSUFOP afirma que se posicionar contra a terceirização não significa se posicionar contra os terceirizados: “Pelo contrário, é defender postos de trabalho mais justos, estáveis, com planos de carreira e direitos trabalhistas.”

    A Divisão de Contratos de Terceirização foi criada na UFOP em 2019, através da aprovação do CUNI, e é subordinada à Coordenadoria de Gestão da Pró-Reitoria de Orçamento, Planejamento e Administração (PROPLAD) sob a supervisão do Pró-Reitor Adjunto. Na data de aprovação, foram definidas as condutas e atribuições da Divisão, que incluem a coordenação dos processos de gestão e a fiscalização dos contratos de prestação de serviços firmados com diversas empresas, que incluem atividades como produção e fornecimento de refeições, serviços de limpeza, portaria, jardinagem, recepção, manutenção predial, vigilância armada, serviços gerais, vigias e motoristas.

    Prof. Mateus Pereira, diretor do ICHS e professor do Departamento de História, declara que a funcionária foi demitida pela alegação de “baixa produtividade”, mas observa que não existe índice para essa avaliação e que a Direção não foi consultada.

    Segundo Prof. Mateus, ela é uma das funcionárias mais comprometidas e ativas do Instituto, ao qual dedicou vários anos de sua vida, e onde desempenha plenamente suas funções, as quais possui interesse de continuar exercendo. Na opinião do diretor, essa situação pode gerar medo no Instituto como um todo: “A empresa demonstrou que a história da servidora com a Instituição não parece muito importante, ficamos bastante chocados com isso. A situação nos causou muita consternação e tristeza, não só pela Neudis, que tem uma longa trajetória conosco, mas por todas as pessoas que trabalham conosco de forma terceirizada. Acredito que isso pode gerar um certo pânico dentro do Instituto, já que os funcionários podem ser dispensados sem uma explicação plausível.”

    O diretor explica que toda precarização destitui os trabalhadores, deixando-os com o mínimo de direitos possíveis, para que o capital governe plenamente. Em sua opinião, a  grande contradição é que isso aconteça dentro do Estado, como no caso das Universidades que desde a década de 90 têm deixado de fazer concursos para a carreira TAE (Técnicos Administrativos em Educação), para optar por uma solução supostamente mais barata: “ A principal consequência disso é transformar as pessoas em objetos a serem descartados ou a se tornarem obsoletos segundo os interesses menos republicanos e até menos humanos,” explica ele.

    Neudis conta que ao longo de 17 anos, foi por meio de empresas terceirizadas que prestou serviços ao ICHS, com responsabilidade e atenção. Dessa forma, atingiu o tempo previsto para se aposentar, e no momento da aposentadoria informou que gostaria de continuar trabalhando, pedido que foi aceito. “O mercado de trabalho para pessoas de 60 anos ou mais vem crescendo significativamente na sociedade com o intuito de afirmar a nossa capacidade e comprometimento ao trabalho, e mesmo assim somos surpreendidos com discurso de baixa produtividade, termo esse utilizado para uma dispensa sem muita justificativa. Triste saber que após 17 anos de dedicação somos considerados como baixa produção. Eu me considero uma profissional ativa e disposta para continuar a prestar os meus serviços da melhor forma possível. Agradeço desde o início do meu trabalho no Instituto aos competentes da gestão de contratos, ao diretor Mateus e demais pessoas que acreditam no meu potencial no ICHS,” declara a funcionária.

    NOTA: Através de email a repórter Beatriz tentou contactar a empresa desde dia 09/10/2024 para se pronunciar, caso fosse sua vontade, porém até o momento a empresa não respondeu.

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